domingo, 22 de janeiro de 2012

Saudades

Saudades das noites em que ia para a cama e se despedia de nós com um adeus, atirava beijos para o ar e enrolava-se nos lençóis, de rabo para o ar e, simplesmente, dormia. Agora é uma dor. Desde que começo a dizer que está na hora de ir lavar os dentes, as mãos, mudar a fralda, que se ouve um não temeroso, quando insisto para arrumar os brinquedos, os olhos começam já a ter lágrimas e, depois, é chorar, com as lágrimas a rolar, de pé, na cama e a chamar mãeeeeeee, enquanto hesito entre afastar-me logo, resoluta e calma, ou dar mais um mimo, um beijo, uma festa.
Começou uns dias antes dos dois anos, recordo-me de começar a notar a diferença em pequenos pormenores da rotina. A resistência tem aumentado e, se ainda não posso chamar uma guerra à hora de dormir, felizmente, o que me parte o coração é deixá-la chorar.
Eu sei, eu sei, ela chora durante cinco minutos, mesmo, contados no meu relógio, mas o que me doem esses tantos minutos! E depois desses minutos, as horas do dia em que ando a pensar se não estou a ser um coração de pedra por deixá-la assim, na cama, sozinha, no escuro, a chamar por mim, por companhia, por mimo. Depois ouço a voz da consciência e da razão, que é o pai, e que relembra, que ela não tem fome, não tem frio, tem mimo e amor durante todo o dia, está num quarto quente e confortável, não está deixada no escuro, mas aconchegada, confortável, com a porta entreaberta para nos ouvir e ver uma luz de presença. 
Então porque é que continuo a perguntar-me se é este o caminho, deixá-la na cama, mesmo que a chorar por um bocado, ou se devia ceder à escravatura do mimo e ficar a dar colo, sob pena ser raptada todas as noites, como os meus pais, que reclamam não ter dormido durante três anos porque eu sempre adormecia ao colo e sempre acordava quando me punham na cama? Porque é que então me pergunto se não estarei a embarcar em modas pedagógicas? Pode ser o melhor, sim, pode ser que não deixe os traumas que eu fico a imaginar que podem ficar, e, sim, vou persistir. Mas vou sob protesto! Ensinem lá uma mãe a negar mimo à sua cria e não ficar para morrer com o coração do tamanho de uma ervilha?...     

1 comentário:

  1. Olha querida Raquel... só te posso contar o que vivi na pele (esta adulta traumatizada que sou :D). Quando me chegou a mania de não dormir, chegou juntamente com a de "só consigo adormecer se me deres a mão" e tendo a mãe cedido, seguiu-se: "eu só consigo dormir – toda a noite – se estiver de mão dada contigo"... há 30 anos não havia modas pedagógicas, a minha mãe, não sei se pensando duas vezes ou não, pôs-me um cobertorzinho no chão, ao lado da sua cama, e disse-me para dormir ali. Não devo ter dormido grande coisa (a nova cama era um pouco dura) porque rapidamente voltei para a minha cama, sem mão dada. Adoro a minha mãe por todas as vezes que me disse que não e que me fez aceitar melhor a vida. Tenho a certeza de que sou mais saudável e razoável por isso. O único trauma que me ficou desta experiência é que continuo a não gostar de dormir no chão :D

    ResponderEliminar